Fonte: O Estado de S. Paulo. Dia 27/4/2019. Link
Jandir J. Dalle Lucca (*)
Pontes de Miranda já ponderava em seu “Tratado de Direito Privado” que “Onde não há renda não é concebível imposto de renda” (vol. 50, Ed. Rev. dos Tribunais).Contudo, não obstante a obviedade de tal assertiva, há várias situações presentes no cotidiano dos contribuintes que parecem desmentir o festejado mestre.
Uma delas se encontra prevista no inciso VI do artigo 23 da Lei 4.506/1964, que dispõe que: “Serão classificados como aluguéis ou ´royalties´ tôdas as espécies de rendimentos percebidos pela ocupação, uso, fruição ou exploração dos bens e direitos referidos nos artigos 21 e 22, tais como: (…)o valor locativo do prédio urbano construído, quando cedido seu uso gratuitamente”.
Essa regra se encontra atualmente regulamentada pelo §1º do artigo 41 do Decreto 9.580/2018 (RIR/2018), que estabelece que: “Na hipótese de imóvel cedido gratuitamente, constitui rendimento tributável na declaração de ajuste anual o equivalente a dez por cento do seu valor venal, ou do valor constante da guia do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU correspondente ao ano-calendário da declaração, ressalvado o disposto na alínea ´b´ do inciso VII do caput do art. 35 (Lei nº 4.506, de 1964, art. 23, caput, inciso VI)”.
As exceções são tratadas pelo artigo 6º, III da Lei 7.713/1988 e pelo artigo 35, VII, letra “b” do referido do Decreto 9.580/2018, que consideram isento ou não tributável “o valor locativo do prédio construído, quando ocupado por seu proprietário ou cedido gratuitamente para uso do cônjuge ou de parentes de primeiro grau”.
No âmbito administrativo, a matéria é atualmente versada pela Instrução Normativa RFB 1500, de 29 de outubro de 2014, cujos artigos 11, II e76 reproduzem os indigitados comandos legais.
Vale dizer, fora as hipóteses em que sejam ocupados pelo próprio titular, seu cônjuge ou seus parentes de primeiro grau, os imóveis cedidos em comodato, cuja natureza pressupõe a gratuidade da cessão, ensejarão a obrigatoriedade de o proprietário oferecer à tributação o valor equivalente a 10% (dez por cento) do valor venal a eles atribuído pela municipalidade para a cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU no respectivo ano-calendário da declaração.
Portanto, não obstante a Constituição Federal tenha claramente atribuído competência impositiva para a União Federal instituir imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza (art.153, III) e o Código Tributário Nacional estipule que aquele tributo tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos; e de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos anteriormente (artigo 43), recomenda-se cautela aos proprietários de bens imobiliários ao cederem os mesmos para uso gratuito de terceiros, ainda que para o uso de pessoas jurídicas das quais sejam titulares.
(*)Jandir J. Dalle Lucca é juiz integrante da 1ª Câmara Julgadora do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo (TIT) e sócio fundador do Dalle Lucca, Henneberg, Duque Bertasi e Linard Advogados