A ilegalidade da adoção do “valor venal de referência“ ao invés do “valor venal” utilizado pelo IPTU como base de cálculo do ITCMD

O Imposto Sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Bens e Direitos – ITCMD incide sobre transferências não onerosas de bens imóveis, bens móveis ou direitos. Incide tanto sobre a transmissão de bens do falecido aos seus herdeiros quanto pela doação inter vivos, quando alguém, por mera liberalidade, transfere seu patrimônio a outrem.

O ITCMD é tributo de competência dos Estados e do Distrito Federal, e no caso do Estado de São Paulo foi previsto pela Lei Estadual nº 10.705/00.

Em relação aos bens imóveis, a aludida legislação prescreve como base de cálculo do tributo o valor venal do bem, que não pode ser inferior ao utilizado para o cálculo do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), no caso de bens imóveis urbanos, ou do ITR (Imposto Territorial Rural), em caso de bens imóveis rurais.

Sobre o valor venal do bem, é aplicada a alíquota de 4% (quatro por cento), chegando-se ao valor devido. Assim, no caso de um bem imóvel urbano cujo valor venal do IPTU esteja fixado em R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), o ITCMD a ser recolhido será de R$ 8.000,00 (oito mil reais), correspondendo a 4% (quatro por cento) do valor do bem transmitido por sucessão ou doação.

A grande vantagem para o contribuinte de se ter o valor venal do IPTU ou do ITR como base de cálculo para o valor do ITCMD, é que muito geralmente este valor é significativamente inferior ao do valor de mercado do imóvel.

Para fins de incidência de outro imposto, o ITBI (Imposto Sobre a Transmissão de Bens Inter Vivos), em alguns municípios como em São Paulo, passou a ser divulgado o “valor venal de referência”, o qual se aproxima (e por vezes ultrapassa) o valor de mercado do bem.

Tendo em vista esta disparidade, o Executivo paulista vislumbrou a oportunidade de ampliar a arrecadação do ITCMD, alterando sua base de cálculo por meio de decreto, para que passasse a ser o “valor venal de referência“, o qual é utilizado para cálculo do ITBI, ao invés da tabela proposta para fins de incidência do IPTU.

Vários contribuintes têm se insurgido judicialmente contra esta indevida majoração pretendida pelo Estado de São Paulo, e na grande maioria dos casos, o Judiciário tem acolhido o entendimento de que tal majoração deveria ter sido deflagrada por lei, e não por decreto.

Em reiteradas decisões, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo tem considerado que a pretensão de fixar a base de cálculo do ITCMD por decreto fere o princípio constitucional da legalidade tributária, que preconiza a existência de lei para aumentar ou exigir tributos (artigo 150, inciso I, da Constituição Federal).

Frise-se que embora prevalecente, a jurisprudência ainda não se encontra pacificada, em linhas gerais avista-se possível êxito em discussão judicial em face desta exigência pretendida pelo Fisco Paulista, inclusive para casos em que o imposto já foi recolhido, por meio de repetição de indébito.

Fernando Assef Sapia, advogado

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